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Nominalismo de Hobbes e o Quarto Chinês de Searle: Conexões Filosóficas

A filosofia, ao longo de sua história, tem explorado profundamente a relação entre linguagem, pensamento e realidade. Recentemente, ao ler um artigo sobre John Searle, um renomado filósofo analítico, deparei-me com a seguinte afirmação: "o computador também não entende a história sobre a qual ele responde, por mais que essas respostas sejam corretas e semelhantes às que seriam dadas por um ser humano." Essa observação trouxe à minha mente o pensamento de Thomas Hobbes, especialmente no que diz respeito ao nominalismo e à maneira, segundo ele, como a mente humana manipula nomes e símbolos para construir significado.


O nominalismo de Thomas Hobbes e o experimento mental do Quarto Chinês de John Searle oferecem contribuições significativas para essa discussão, especialmente no que tange ao significado e à compreensão. Por isso, hoje vamos percorrer um pouquinho as reflexões neste campo de estudo. Para começar vamos falar um pouco de Hobbes.




Isso não é uma maçã, é uma pedra
Isso não é uma maçã, é uma pedra

Nominalismo de Hobbes: Nomes e Pensamento

Thomas Hobbes (1588-1679), em sua obra Leviatã, sustentava que os nomes e conceitos que utilizamos não derivam de essências metafísicas intrínsecas dos objetos, mas de experiências que são desginadas por convenções humanas. Para Hobbes, em outras palavras, o pensamento é uma operação sobre nomes: os seres humanos manipulam palavras e signos para organizar a experiência sensorial e gerar conhecimento. O significado das palavras não é inerente à realidade, mas depende de associações que construímos entre os nomes e nossas percepções.

Por exemplo, quando chamamos uma fruta de “maçã”, o termo não captura uma essência metafísica da fruta, mas é uma designação prática para nos comunicarmos sobre ela. Se decidíssemos convencionar o termo “pedra” para designar a maçã, isso geraria um conflito de significado dentro do sistema linguístico, mas não mudaria a realidade subjacente. Ou seja, mesmo que mudemos o nome, a fruta em si - com sua cor, sabor e textura - continua a mesma. A realidade dela, aquilo que ela é de verdade, não depende de como a chamamos. O nome é apenas uma etiqueta que colocamos para nos comunicar sobre ela, mas não altera sua essência.


O Quarto Chinês de John Searle: Sintaxe versus Semântica

No século XX, John Searle propôs o experimento mental conhecido como Quarto Chinês para desafiar a ideia de que computadores podem compreender linguagem ou pensar. Nesse experimento, uma pessoa trancada em um quarto recebe mensagens em chinês e, sem compreender o idioma, segue regras sintáticas (como um manual) para manipular os símbolos e devolver respostas também em chinês.

 No Quarto Chinês, uma pessoa sem compreensão da língua chinesa manipula símbolos de acordo com regras sintáticas, produzindo respostas em chinês que parecem corretas para um observador externo. Contudo, Searle argumenta que essa pessoa não tem compreensão real do que está dizendo, apenas manipula símbolos de forma mecânica. Para ele, a compreensão verdadeira envolve não apenas a manipulação de símbolos, mas a atribuição de significado a eles, o que requer uma experiência subjetiva e intencional.


Conexões Entre Hobbes e Searle

Aparentemente, Hobbes e Searle operam em campos distintos: um focado no pensamento humano e o outro na inteligência artificial, e diga-se de passagem o termo "inteligência" artificial me incomoda muito.

A discussão entre Hobbes e Searle levanta questões fundamentais sobre linguagem, pensamento e inteligência artificial.

No entanto, suas ideias convergem em vários pontos fundamentais que gostaria, com a sua permissão caro leitor, levantar aqui rapidamente:


Maçã em Mandarim
Maçã em Mandarim

1. Manipulação de Símbolos

  • Para Hobbes, o pensamento é essencialmente uma manipulação de nomes e conceitos, o que poderia ser visto como análogo à operação de computadores modernos.

  • Para Searle, a manipulação de símbolos é o que os computadores fazem. Contudo, ele enfatiza que isso não equivale à compreensão ou ao pensamento humano.

2. Significado e Convenção

  • Hobbes sugere que o significado dos nomes é uma convenção humana. Trocar “maçã” por “pedra” cria conflitos dentro de um sistema linguístico convencional, mas não altera a realidade percebida.

  • No Quarto Chinês, Searle demonstra que o computador (ou o operador do quarto) não é capaz de atribuir significado, mesmo que manipule os símbolos de forma eficiente.

3. IA como Extensão do Nominalismo

  • A inteligência artificial, em muitos aspectos, é uma realização prática do nominalismo: ela opera manipulando nomes e símbolos sem nenhuma ligação com essências metafísicas.

  • No entanto, Searle aponta que, sem experiência subjetiva, as máquinas nunca passam do nível sintático para o semântico, diferentemente da mente humana nominalista que reflete sobre os significados.


Reflexões Finais

A discussão entre Hobbes e Searle levanta questões fundamentais sobre linguagem, pensamento e inteligência artificial. Hobbes antecipa, em certa medida, a natureza simbólica da IA, mas Searle nos lembra das limitações dessa abordagem: a compreensão semântica e a experiência subjetiva humana ainda estão fora do alcance das máquinas. Como nominalista, Hobbes acreditava que a mente humana opera como um sistema de manipulação de signos e nomes. Para ele, a linguagem é uma ferramenta para organizar pensamentos e descrever a realidade, mas sem uma conexão intrínseca entre os nomes e os objetos que representam. No experimento mental do "Quarto Chinês", Searle argumenta que a IA não compreende os símbolos que manipula, apenas segue regras para organizá-los.


As IAs sabem dizer: obrigado!; mas não conetam em si mesmas o sentimento do agradecimento
As IAs sabem dizer: obrigado!; mas não conetam em si mesmas o sentimento do agradecimento

Ambos concordam que manipular símbolos não equivale a compreender seus significados. Hobbes, assim como Searle, aponta que as IAs apenas reorganizam signos de forma mecânica, sem acessar o entendimento subjacente.

Isso significa dizer que. por um lado, Hobbes via o pensamento humano como um cálculo mecânico, mas reconhecia que isso estava enraizado na experiência sensorial e nas paixões humanas; por outro, Searle argumenta que a IA pode simular entendimento, mas não tem acesso a estados mentais como intenção ou consciência. Hobbes e Searle, portanto, compartilhariam a visão de que o pensamento humano envolve algo mais do que o mero processamento de informações. A ideia central compartilhada entre os dois é que o processo de manipular símbolos (sejam palavras, signos ou outros tipos de representações) não leva necessariamente à compreensão profunda ou verdadeira daquilo que esses símbolos representam.


Neste sentido, a compreensão genuína vai além da sintaxe e das convenções; ela depende da experiência, do contexto e da atribuição de significado.

Essa pequena reflexão e análise também me revela um ponto crucial: a distinção entre manipulação de símbolos e compreensão verdadeira permanece um dos maiores desafios filosóficos e tecnológicos de nosso tempo. Em um mundo cada vez mais dominado por inteligências artificiais, retornar às reflexões de Hobbes e Searle é essencial para compreender os limites e as possibilidades dessas tecnologias.


Bora filosofar!


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